
Setembro 5 retrata um dos episódios mais sombrios da história das Olimpíadas: o atentado à equipe israelense durante os Jogos de Munique, em 1972. Desde o início, o filme demonstra consciência sobre a delicadeza do tema, especialmente em um momento em que o conflito entre Israel e Palestina segue em destaque no cenário internacional. Ciente disso, a obra evita paralelos políticos contemporâneos, concentrando-se nos eventos de 1972. A tragédia serve como pano de fundo para uma discussão mais ampla sobre o papel do jornalismo na cobertura de acontecimentos de grande impacto, explorando seus desafios, dilemas éticos e pressões.

A narrativa acompanha uma equipe da rede americana ABC, inicialmente designada para cobrir os Jogos, mas que, de forma inesperada, se vê diante da responsabilidade de relatar uma tragédia ao vivo. Em questão de segundos, a cobertura esportiva se transforma em um relato de crise. O que antes era uma equipe habituada a transmissões de eventos esportivos agora precisa lidar com a complexidade de reportar um acontecimento de repercussão internacional.

A maior parte da trama se desenrola dentro do estúdio da emissora, um espaço onde a informação chega em fragmentos, ligações apressadas, telegramas e transmissões de outros veículos. A ausência da luz do sol reforça a sensação de isolamento, enquanto a incerteza sobre o que realmente está acontecendo do lado de fora torna o ambiente cada vez mais sufocante. A urgência da notícia colide com a falta de controle sobre os acontecimentos, criando uma atmosfera de tensão que se espalha por cada cena. A sensação de clausura é palpável. O tempo parece desacelerar, tornando cada segundo mais angustiante, como se os personagens estivessem presos não apenas entre quatro paredes, mas dentro da própria incapacidade de enxergar o quadro completo.
Ainda que a narrativa corresse o risco de se tornar monótona, a cinematografia e os enquadramentos capturam com precisão essa inquietação crescente, transmitindo ao espectador a claustrofobia e o peso emocional que recai sobre a equipe. A qualquer momento, algo pode acontecer, e essa iminência constante sustenta o suspense do início ao fim.

Os personagens centrais Roone Arledge, Geoff Mason e Marvin Bader, interpretados por Peter Sarsgaard, John Magaro e Ben Chaplin, respectivamente, têm seus tempos de tela bem distribuídos, com destaque para Magaro, cuja atuação captura com intensidade o peso da responsabilidade que recai sobre Geoff. Desde o início, sentimos sua inquietação crescer a cada ligação atendida, a cada conversa carregada de incertezas. O tempo parece se alongar conforme a pressão aumenta, e a angústia de tomar a decisão errada se torna quase sufocante. Magaro transmite essa tensão sem precisar de grandes diálogos; sua expressão, seus gestos e hesitações falam por si. Geoff representa o jovem profissional que, diante de uma situação extrema, precisa amadurecer rapidamente e assumir um desafio que nunca imaginou enfrentar, levar ao público uma notícia que mudará a história.
Enquanto Geoff vive o choque da experiência, Arledge e Bader expõem os dilemas internos da emissora. Atrás das câmeras, decisões difíceis precisam ser tomadas, e a tensão não se limita apenas ao que será noticiado, mas ao impacto que cada escolha terá. Em um ambiente onde interesses empresariais e a necessidade de informar muitas vezes se chocam, a trama revela os bastidores de um jornalismo sob pressão, onde cada decisão pode determinar não apenas a carreira dos envolvidos, mas a forma como o mundo verá aquele momento trágico.

Mais do que relatar a tragédia de 1972, Setembro 5 mergulha no universo do jornalismo e nos dilemas éticos que moldam a profissão. A obra não busca apenas reconstruir os acontecimentos, mas refletir sobre os limites e as responsabilidades da imprensa diante de uma cobertura de grande impacto. O que cabe ao jornalista observar e transmitir? Até onde vai seu compromisso com a verdade? A narrativa constrói um debate essencial dentro do ambiente jornalístico: de um lado, a cobertura como um feito profissional, um marco que pode definir carreiras; do outro, a obrigação de informar o público sem distorções ou omissões. Não há respostas simples, nem verdades absolutas. A ética da comunicação não se resume a certo ou errado, mas opera em uma zona nebulosa, onde interesses frequentemente entram em conflito ou encontram uma frágil convergência. No fim, o que prevalece não é apenas o que foi noticiado, mas quem controla a narrativa.

Em um mundo onde o jornalismo tradicional perde espaço para a avalanche de informações disseminadas pela internet, Setembro 5 surge como um retrato imersivo da realidade enfrentada pelos profissionais que se dedicam a levar a verdade ao público. O filme expõe os desafios, dilemas e pressões que permeiam a cobertura jornalística em momentos críticos, destacando a importância de uma imprensa comprometida com os fatos. A cobertura da ABC, a primeira transmissão ao vivo e em cores de um evento dessa magnitude, não apenas marcou a história da televisão, mas também influenciou o modo como tragédias passaram a ser noticiadas. A necessidade de relatar os fatos em tempo real estabeleceu um modelo que ecoa até hoje, ao mesmo tempo em que reforça o impacto da mídia na construção da memória coletiva.
No entanto, hoje essa missão enfrenta ataques constantes de narrativas que não se preocupam em transmitir os fatos, mas em construir realidades convenientes a determinados interesses. O que não se encaixa nesse jogo de versões pode ser facilmente descartado, sem pudor ou escrúpulos. A informação deixou de ser um serviço público para, muitas vezes, se transformar em mero entretenimento, fabricando percepções que reforçam supostas narrativas: nós contra eles, certo contra errado, verdade contra mentira. Mas a pergunta que realmente deveria ser feita é: quem se beneficia com essa dicotomia?

O filme é uma imersão intensa no universo jornalístico, um suspense que mantém o público tenso do início ao fim, impulsionado por atuações sólidas, uma fotografia envolvente e um enredo de tirar o fôlego. No entanto, a obra tropeça em diálogos que, em alguns momentos, soam pouco envolventes e até amadores. Essa fragilidade pode estar ligada à escrita dividida entre Tim Fehlbaum e Moritz Binder, sendo este o primeiro roteiro de Binder que foi transformado em filme. Apesar disso, o longa se destaca por sua abordagem diferenciada. Enquanto outras produções sobre o atentado de 1972 focam nos acontecimentos em si, Setembro 5 opta por explorar a perspectiva da equipe jornalística da ABC, que, de forma inesperada, se viu diante do desafio de cobrir uma tragédia de proporções inéditas.
A tensão cresce a cada instante, transformando o estúdio em um campo de batalha emocional, onde cada decisão pode impactar a forma como o mundo enxerga os fatos. A obra não apenas resgata um episódio marcante da imprensa, mas também nos faz refletir sobre os dilemas e a responsabilidade de quem traz a notícia em meio ao caos.

Assinatura: Thales Nunes
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